Um conto no universo pós-apocalíptico de alta magia e tecnologia de Rifts®,
por Victor H. S. Thomaz
Nosso BTP Mark V chacoalhava conforme viajávamos bem longe das estradas. Nosso comboio, liderado pelo Coronel James Wheeler, contornava os ermos selvagens do que muito antigamente chamava-se Canadá, buscando flanquear as forças do estado separatista de Quebec e apunhalar diretamente em sua aorta. Como a adaga muito bem manuseada pelo alto-comando da Coalizão. Afinal, a Campanha da Unidade seria uma operação precisa e letal, promessa do Imperador para nós, soldados em campo.
Eu verificava mais uma vez o fio da minha Vibro-Faca para me certificar de que ela estivesse plenamente funcional. Nenhuma das minhas cicatrizes de batalha estavam borradas no reflexo em minha lâmina, ela estava pristina e operante. Quando a guardei novamente, eu vi a figura do Soldado Pratt logo em minha frente, seu rosto jovial não tinha nem sequer vestígios de barba, e ele me olhava como se eu fosse uma fera atroz. Ele ainda teve a audácia de perguntar:
– Capitão! Estamos indo em direção a Quebec, não é? Eu jurava que eles iriam nos mandar para o fronte de Tolkeen. – Disse ele, quase se curvando enquanto segurava-se no suporte do veículo.
– Nós estamos, onde o Imperador quer que estamos! Soldado! – Eu respondi, olhando para ele como uma fera.
– Quebec era um Estado da Coalizão como qualquer outro. Eles são tão humanos quanto nós, não? Eles não são como os malditos feiticeiros, D-Bees e monstros que vieram das fendas.
Não respondi logo de início, apenas fitei os outros soldados no BTP, cujos olhares eram mistos. Eles esperavam por uma resposta contundente de seu oficial em comando. Eu simplesmente me levantei, me dirigi para próximo da cabine dos pilotos, e me virei para os tripulantes.
– Soldados da Coalizão de Estados! Pelo que vocês lutam?!
– Pela Humanidade!!! – O brado deles era como uma orquestra bem conduzida por um maestro competente.
– Soldados da Coalizão de Estados! Quem é seu Comandante!?
– O Imperador!!!
– Quem?!
– Imperador Karl Prosek! Mestre de Chi-Town e Líder da Humanidade!!!
Quase abriu um sorriso em meu rosto ao ouvir isto. Mas eu novamente me virei para o insolente Pratt, e bradei a todos pulmões próximo ao seu ouvido enquanto o segurava – esta armadura! É chamada de Dead Boy por nossos inimigos! Sabe porque, soldado?!
Eu o vislumbrava da cabeça aos pés, ele não conseguia falar mais nada, como se estivesse sob um vil feitiço. A armadura negra com relevos brancos em forma de ossos do esqueleto humano o adornava, assim como todos nós naquele BTP.
– Todos nós vestimos esta armadura! Que representa MORTE para os inimigos da Coalizão!!! E o estado de Quebec, abandonou a luz do Imperador para abraçar a arrogância! Se virando contra Chi-Town e todos os outros estados! Eles são inimigos da Coalizão, assim como a escória de magos e alienígenas da Federação da Magia e de Tolkeen!!!
Então me virei para o resto dos soldados. – Eu fui claro?!
– Sim senhor, Capitão!!!
Foi satisfatório ouvir a voz do Soldado Pratt entre eles.
Mas não tive tempo de comemorar, pois o veículo parou de repente. O veículo à nossa frente, comandado pelo Coronel Wheeler, parou primeiro. Na frente dele, uma luz intensa obscurecia toda a visão à frente do comboio, como se estivéssemos em rumo ao além.
Uma voz no rádio nos recomendou a desligar os faróis dos nossos BTPs, e então tudo estava claro. À nossa frente, a trilha subia até uma clareira, e eu pude contar até quatro figuras em um tipo de armadura motorizada que eu nunca havia visto. Tinham mais de 3 metros de altura, feitas de puro crômio que espelhava perfeitamente a luz da lua e a das estrelas. Em seus ombros largos havia suporte para um canhão tão grande quanto o corpo. O capacete era perfeitamente simétrico e cheio de tubos de exaustão que mais pareciam chifres demoníacos, a face indiferente era marcada apenas por linhas na parte do visor.
Os scans imediatamente deram seu resultado:
Não tardou para que os nossos robôs veiculares de combate UAR-1 Enforcer saíssem pelas matas de coníferas ao lado, derrubando todos os obstáculos em seu caminho com suas pernas e braços de metal pesado. Verdadeiras torres com 9 metros de altura, com forma de esqueleto humano, literalmente armado até os dentes. O orgulho das Indústrias da Coalizão! Ambos começaram a circular a clareira onde as figuras em armadura reluzente estavam, enquanto os BTPs atrás começaram suas manobras de formação de combate.
– Lieutenant ! Nous sommes encerclés ! – A voz ribombante que saia de uma das armaduras confirmava que eram traidores!
– Préparez la position de tir ! – Isto me lembrou que eu não estava com o tradutor ligado, mas honestamente, eu não me importava.
Eu só pude observar da cabine dos pilotos, eles simplesmente se posicionaram de frente para nossos veículos e robôs de combate. Então o som do que parecia ser uma broca escavando partiu dos volumosos pés das armaduras motorizadas. Eu peguei o rádio.
– Capitão Stone para Coronel Wheeler. Na escuta?
Eu apenas ouvia chiado da estática como resposta.
– Coronel. Estamos cercando quatro rebeldes, e somos um batalhão de BTPs Mark V e robôs UAR-1. Temos poder de fogo para lavá-los à idade da pedra! Por que diabos não estamos atirando?!
Ou o Coronel desaprendeu a responder a porra do rádio, ou ele ficou maravilhado com as armaduras reluzentes do inimigo! De qualquer forma, eu me virei para os soldados que já colocaram os capacetes.
– Mantenham posição! Eu vou falar com o Coronel pessoalmente!
Eu saí do veículo e pude vislumbrar a cena sem os filtros de visores eletrônicos, era como uma pintura clássica bem na frente dos meus olhos! Por um segundo eu pude olhar o meu reflexo nas armaduras, era mais nítido que o da minha Vibro-Faca! Mas então eu notei, um jato azulado saia das costas das armaduras, aquilo era para compensar o recuo dos canhões! E eles estavam apon…
BOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOM!!!
Era a última coisa que eu ouvi… Eu estava no chão.
Aquilo foi como um Martelo de Impacto acertando o meu corpo. Depois, somente o barulho branco em meus ouvidos, mais proeminente no esquerdo. Meus sentidos estavam mexidos feito um omelete, e eu estava totalmente sem fôlego, com a garganta ardendo. Eu estava dando o maior e mais longo grito inaudível.
Quando eu recobrei o meu senso de si, o calor infernal, e fumaça de metal derretido me sufocava. Eu olhei para trás e vi o BTP que eu comandava ardendo em chamas! Com um buraco de entrada perfeitamente alinhado com o de saída do veículo à frente, o do Coronel. Apenas com o ouvido direito, eu era afligido com os gritos de dor e de socorro dos tripulantes azarados que sobreviveram ao impacto direto. Minha mão estava no ouvido esquerdo, o que estava em direção ao estrondo, dele eu não sentia mais nada, além de dor e o barulho branco. Quando eu tirei a mão, eu vi que ela tinha uma mancha vermelha… Aquilo era… Sangue?
Eu olhei em volta, apenas para ver os últimos segundos de um UAR-1 Enforcer. Onde deveria estar seu braço direito agora era um maçarico vertendo óleo flamejante, as luzes vermelhas dos seus olhos piscaram pela última vez, antes que o monstro de metal caísse. O outro, já era uma pilha de sucata incandescente no chão.
Os soldados sobreviventes abriram fogo contra os monstros de crômio assim que recobraram a consciência. Porém, os feixes vermelhos de seus fuzis de pulso laser eram refletidos pela superfície das brilhantes armaduras, cujos pilotos ficaram inertes em suas posições.
Do céu, os motores a jato de um veículo de transporte rugiam. Ele carregava uma Flor-de-Lis onde deveria estar a Caveira da Morte. Era a maldita extração dos separatistas! Eu tinha pouco tempo para preparar a minha vingança. Saquei minha Vibro-Faca e meu cinto com granadas, então comecei a confeccionar um presente para eles!
Demorou poucos segundos para eu ter um buquê de granadas comigo. Cortesia das Forças Especiais da Coalizão! Então, corri em direção a eles como um tigre focado em sua presa.
Eu alcancei o mais próximo com o presente em mãos. Mas antes que eu pudesse puxar o pino para iniciar a reação em cadeia da retribuição, ele me agarrou pelo pescoço, usando apenas dois dedos de sua armadura, e me ergueu para a altura de seu capacete. Eu o encarava sem fôlego, pelos segundos mais longos da minha vida. Verdade seja dita, ele podia acabar com a minha miséria com um simples pressionar dos seus dedos, mas ele era como um gato, curioso com a sua presa.
– Lâche-le ! Nous partons, soldat ! – A voz partia de outra armadura, exatamente quando o VTOL de transporte pousava.
O soldado me arremessou para o alto, como uma criança entediada com o seu brinquedo. Mas eu estava com o dedo no pino, e assim ele foi arrancado com o movimento! As granadas estavam no ar, entre eu e ele quando elas explodiram!
Eu então… Tudo escuro…
Nem soube se o meu truque com explosivos fez o que eu queria. Pois eu acordei em uma maca de um hospital de campo, uma semana depois. Eu não sentia mais o meu braço e perna direita, e meu ouvido esquerdo. Daquele batalhão, somente eu e mais cinco sobreviveram. Soldado Pratt… Coronel Wheeler… Nenhum desses nomes estava entre eles.