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Sinta o PEM

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As copas das árvores eram magnificamente verdes, como nem mesmo nas antigas revistas poderia se ver. Marcos imaginou que antes da queda das bombas poderia ter sido assim, bem diferente daquelas árvores de folhas sempre amareladas que nasciam dentro dos muros da cidade. Talvez os antigos impressos teriam simplesmente perdido a cor com o passar do tempo. Afinal, são quase 25 anos desde que o mundo foi devastado e o povo poderia ter se esquecido de como a vegetação já foi frondosa.
Uma curva acentuada feita pelo piloto do quadricóptero chacoalhou o veículo e retirou Marcos de seus devaneios. Se agarrando ao batente da escotilha aberta, ele segura o fuzil com a habilidade natural de um soldado experiente. A missão era de reconhecimento, para localizar uma torre ou algo assim. Apenas Jules, o sargento que chefiava a missão é que tinha informações precisas sobre o alvo da busca, mas Marcos tinha suspeitas de que era algo impossível, algo que o levara a mergulhar em pensamentos distantes em busca de respostas racionais.
 
Moradores das cidades do além-muro costumavam visitar Brasília para sobreviver, traçando um comércio autorizado pelo poder maior do Domo. Eles traziam iguarias mutantes colhidas do Emaranhado, animais bizarros, frutas alucinógenas, remédios milagrosos e até mesmo armas modificadas com algum tipo de organismo vivo. Obviamente muitas destas tranqueiras eram proibidas e não era incomum de se ver um ou outro destes comerciantes sendo presos e tendo suas mercadorias apreendidas na passagem do portão, antes de voltarem pra suas vilas distantes.
Certo dia um destes viajantes das terras ermas falou a Marcos sobre um tal obelisco. O velho desdentado não podia se sustentar de pé e se apoiava sobre uma bengala tosca de madeira retorcida, mal esculpida e suja. Sua barba aparentava alguma tentativa de cuidados higiênicos, mas sem sucesso, algum produto improvisado deixara veios negros misturados aos fios grisalhos, como se tivesse tentado limpá-la com óleo diesel.
A sabedoria do velho conquistou Marcos acentuando a curiosidade que trazia consigo sobre o que havia além dos enormes muros de Brasília, construídos para a contenção de perigos exteriores como infectados e a vegetação hostil do Emaranhado. O Domo governava a cidade com duros discursos de autossuficiência, tentando eliminar qualquer interesse no que viera de fora – se é que havia muita coisa lá fora.
De todas as histórias, o tal obelisco foi o que mais aguçou a atenção do soldado. Marcos não se deu conta das duas horas que passou ao lado do carrinho de madeira, o mesmo que deveria revistar para localizar mercadorias proibidas. Naquele estágio ele já confiara totalmente no velho manco e não pretendia perder tempo revirando suas tralhas inúteis. Ao invés disso divagava ao som da voz grasnada do ancião, que jurava ter visto um obelisco de perto e até tocado nas suas paredes de pedra.
 
O Domo jamais citara os obeliscos nos noticiários ou em suas propagandas. O assunto que rolava entre os soldados era de que muitas embarcações aéreas já tombaram ao se depararem com um obelisco, como se a estrutura tivesse algum tipo de impulso eletromagnético que desativava por completo qualquer veículo elétrico ou mecânico. Não se sabia a distância exata e nem se poderia prever a aproximação, pois estas colossais torres ficam ocultas por uma tempestade de nuvens que impede até mesmo os satélites do Domo de traçar com exatidão sua geolocalização. Se aproximar por terra é praticamente impossível, pois elas costumam ficar no epicentro das cepas vermelhas e negras do Emaranhado e nenhum homem consegue sair vivo de lá.
Mais uma curva acentuada e um tremor intenso se faz no quadricóptero.
– Estamos nos aproximando!
Diz o copiloto em tom de excitação.
– Fazendo contato visual com o objeto.
Um frio no umbigo e um formigamento nas mãos fizeram-se de imediato quando Marcos ouvira o copiloto. Seus olhos se apertaram e com a testa franzida ele tenta buscar algum sinal visual em meio à névoa que se aproximava. Em pouco tempo as frondosas copas das árvores não podiam mais serem vistas e uma fina chuva começou a salpicar seu rosto.
– Eles não sabem! Eles não sabem! Eles não sabem de nada!
Marcos pula em direção ao sargento Jules e segurando seu colete com força, grita desesperadamente, deixando o homem estupefato e sem reação imediata.
– Você acha que sabe muito e que tem informações privilegiadas? Mas na verdade você não sabe nada! NADA! Nós vamos morrer aqui! Nos mandaram para morrer, porra!
– Recomponha-se homem! O que está fazendo? Por acaso está louco? Volte já para o seu posto antes que eu te meta uma bala para que não coloque a vida da guarnição em perigo!
Marcos retorna à sua posição inicial, se agarra novamente no batente e tenta se acalmar em silêncio. Seus olhos vivenciam um tremor desenfreado, que denuncia o medo a quem puder fitá-los. Por isso esconde seu olhar e suas lágrimas mirando o horizonte vazio onde nem as copas das árvores e nem a luz do sol conseguem aparecer.
Marcos sabia que iria morrer e que ninguém iria saber o que houvera ali. A menos que….
– É isso!
Marcos tem um lapso de raciocínio e sua expressão facial muda para um sorriso tão largo que era impossível de esconder. Ele vira a cabeça olhando para dentro do quadricóptero onde estavam seus quatro companheiros, que o fitavam de volta com espanto. Ele pensa consigo mesmo:
– Estes desgraçados. A chefia sabe que não vamos voltar. Isso é uma missão suicida para que eles localizem o ponto exato da fronteira do pulso. Querem saber até onde conseguem se aproximar do obelisco. O obelisco! Eles realmente existem!
Marcos aponta o dedo indicador para Jules e acusa:
– Você sabia. Você sabia dessa porra toda! Seu idiota! Você vai morrer junto com todos nós! Como não perce…
Antes mesmo de terminar a frase, Jules saca uma pistola do coldre lateral de seu colete e atira em direção a Marcos, que salta para o lado tentando evadir-se do ataque. O fuzil HK-G36 de Marcos estava quase em posição de tiro, em sua mão direita enquanto a esquerda segurava no batente da escotilha.
– A tecnologia alemã nunca falha em combates de perto.
Pensou Marcos enquanto desferia uma rajada fatal que cravejou Jules com buracos que iam do umbigo até a cabeça. Imediatamente os outros soldados intervieram e saraivadas de tiros de diversos calibres eram abafados pelo som da tempestade, num show pirotécnico de clarões intermitentes enquanto, a embarcação perdia velocidade e mergulhava em direção ao desconhecido.

 


Oddcell é um universo de RPG que aborda um planeta Terra em 2048, devastado por uma guerra nuclear sob resquícios de um vírus que transformou pessoas comuns em seres dotados de poderes inimagináveis. Acompanhe o site e fique por dentro das novidades. oddcell.com.br

 

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